quinta-feira, 31 de julho de 2014

Caleidoscópios

- Por que acha que não é feliz? - perguntei.

   Ela continuou me olhando com os olhos abertos. Às vezes era como se ela fechasse alguma cúpula de sua íris, impedindo qualquer leitura do que se passava em seu âmago; e ao mesmo tempo sugasse, atraísse a alma alheia, numa prospecção minuciosa. Sempre me abismou essa sua capacidade ótica.

- Você não é infeliz - eu disse. Fixei meu olhar no açucareiro prateado, desviando um tanto aliviado de sua mira.
- Você sabe o que e felicidade? Alguém por acaso sabe?

   Olhei-a de soslaio, olhava agora o fundo de sua xícara enquanto sorvia o café.

- Você não é infeliz - repeti - Essas coisas a gente vê costurado na retina do outro. Seus olhos irradiam coisas boas. Traz bem-estar sua companhia.

   Ela me sorriu de maneira doce e pôs sua mão sobre a minha, aperto-a levemente e voltou os dedinhos de volta à xicarazinha.

- Acredito que olhos sejam como caleidoscópios - disse ela depois de alguns segundos silenciosos - Dependendo do momento e para quem eles olham, tomam uma formação única. Por mais complexa que seja a figura que olha num segundo - e você é capaz de dizer que decorou cada formação estranha!, num piscar de olhos, pelo mais leve movimento, a imagem muda completamente.

   Seu indicador pequeno e fino contornava a circunferência da xícara já vazia.
   Voltou a me olhar.

- Não pode dizer que conhece toda a infinidade de sentimentos que existe numa pessoa. Por vezes nem ela mesma conhece.