quinta-feira, 31 de julho de 2014

Caleidoscópios

- Por que acha que não é feliz? - perguntei.

   Ela continuou me olhando com os olhos abertos. Às vezes era como se ela fechasse alguma cúpula de sua íris, impedindo qualquer leitura do que se passava em seu âmago; e ao mesmo tempo sugasse, atraísse a alma alheia, numa prospecção minuciosa. Sempre me abismou essa sua capacidade ótica.

- Você não é infeliz - eu disse. Fixei meu olhar no açucareiro prateado, desviando um tanto aliviado de sua mira.
- Você sabe o que e felicidade? Alguém por acaso sabe?

   Olhei-a de soslaio, olhava agora o fundo de sua xícara enquanto sorvia o café.

- Você não é infeliz - repeti - Essas coisas a gente vê costurado na retina do outro. Seus olhos irradiam coisas boas. Traz bem-estar sua companhia.

   Ela me sorriu de maneira doce e pôs sua mão sobre a minha, aperto-a levemente e voltou os dedinhos de volta à xicarazinha.

- Acredito que olhos sejam como caleidoscópios - disse ela depois de alguns segundos silenciosos - Dependendo do momento e para quem eles olham, tomam uma formação única. Por mais complexa que seja a figura que olha num segundo - e você é capaz de dizer que decorou cada formação estranha!, num piscar de olhos, pelo mais leve movimento, a imagem muda completamente.

   Seu indicador pequeno e fino contornava a circunferência da xícara já vazia.
   Voltou a me olhar.

- Não pode dizer que conhece toda a infinidade de sentimentos que existe numa pessoa. Por vezes nem ela mesma conhece.

sábado, 27 de abril de 2013

Bruna

Era como se do nada eu voltasse abruptamente à uma realidade antes submersa - uma realidade fortemente poluída pelo cheiro de gelo seco e pelas acelerações da batida techno. Sentia como se tivesse me mantido no piloto automático até chegar ali. Só agora, diante do ambiente contrastante, dava-me conta de minha presença naquele lugar. Enquanto tentava me lembrar do porquê de ter entrado naquele carro com aquelas pessoas - tarefa difícil com a absurda sonoplastia da casa -, observava aqueles seres pulando em meio à escuridão e às luzes em neon. Três ou quatro fisionomias que julguei serem masculinas, olharam de volta com interesse escancarado. Eu queria aquilo?
-Caipira?! - gritou-me uma moça em meu ouvido.
Bruna. Claro. Havia aceitado seu convite. Que ponto havia chegado minha solidão?
-Não, obrigada! Já bebi demais! - gritei-lhe de volta, experimentando a sensação de usar toda a capacidade das cordas vocais sem obter quase nenhum resultado.
Ela bebeu um largo gole da bebida, lambeu os lábios.
-Toma, vai! Tá bem docinha!
Forjei um sorriso e peguei o copo de sua mão. As outras três ou quatro bebidas que havia sorvido também eram doces e nem por isso meu estado de espírito mudara.
Uns outros dois amigos de Bruna conversavam com ela, estavam animados. Todo mundo ali parecia animado, mas por alguma razão eu sentia aquela alegria oca. Talvez eu precisasse entornar mais aquele copo e no mínimo mais outros três. Bebi um gole generoso.
-E você? Seria fatos delínio ceza? - gritou-me sorrindo um dos amigos de Bruna.
-Oi?!
-Achei você menina chizantequi! Pressunaceza!
-O que?! Desculpe, não entendi nada do que me disse!! - gritei de volta sentindo minha garganta vibrar ao máximo e mesmo assim sem nem conseguir ouvir minha voz direito. Podia não ter entendido suas palavras, mas seu olhar era óbvio.
Chegou perto de mim ao ponto de eu sentir seu perfume e o hálito de cerveja. Gritou-me diretamente no ouvido: "Eu disse que você é a mulher mais interessante daqui! Que te achei uma princesa!"
-Ah.
Nos últimos dias, para não dizer meses (para não dizer sempre), havia fugido daquilo. De obter corpos e mais corpos inabitados de pessoas. A sensação inexplicável de querer companhia quando estava sozinha, e querer ficar sozinha depois que encontrava a companhia. Como alguém que descobre estar cercado procurei inconscientemente a saída.
O rapaz ficou me olhando sorrindo. Como se, ao dizer as 'palavras mágicas', eu devesse esboçar alguma reação esperada.
A saída ficava à esquerda atrás dele, descendo as escadas. Perguntei-me seriamente se seria muito patético se eu fosse embora daquele lugar sem me despedir de ninguém e com aquele copo na mão.
-Vamos ao banheiro! - Bruna me puxou.
No caminho desci a bebida goela abaixo. Uma mão apertou uma de minhas nádegas, olhei para trás: impossível saber quem.
-Nossa, bem melhor aqui! - disse Bruna, finalmente podia ouvir sua voz com a intensa poluição sonora da pista abafada pela porta - Poxa! Não acredito que você bebeu tudo!
Tirou o copo vazio de minha mão e pingou as últimas gotas em sua boca.
-Pensei que fosse para mim.
-E era, mas podia ter dividido, né safada? - deu um tapa em minha bunda. Fora ela quem a agarrara a pouco?
-Precisava mais que você, acredite.
-Tenho uma coisa aqui que tu vais gostar! - Bruna deixou o copo na bancada e abriu a bolsinha tiracolo preta que levava procurando algo com os dedos, sua mão nem caberia inteira de tão pequena que era a bolsa -Tcharãn!
Mostrou-me um tubinho grosso, fosco e preto, parecia um charuto pela metade.
-Que isso? É para fumar?
Bruna explodiu numa gargalhada jogando a cabeça para trás.
-Não, retardada! Isso é um batom! Está chapada?
-Não.
 Olhou-me agora em dúvida. A pergunta fora retórica.
-Passe! É vermelho! Tu vais ficar linda! - deu-me o batom.
-E você?
-Esse dourado já está bom, não fico tão bem de vermelho.
Olhei-me no amplo espelho. De fato o batom viria a calhar, não havia um pingo de cor em meu rosto, exceto o negro das bolitas dos olhos e o preto dos longos cílios e das sobrancelhas. Pálida como um fantasma. Deslizei a barra vermelha nos lábios, tinha um cheiro gostoso de licor de morango.
-Deveria ser crime uma guria com essa tua boca não sair de batom - disse ela, olhando hipnotizada para o vivo da cor.
Eu ri.
-Acho que a chapada aqui é outra.
-Vamos! - tirou o batom de minha mão, enquanto eu espalhava a cor comprimindo um lábio no outro, e o enfiou de volta na bolsinha.
Pegou-me pela mão e foi me conduzindo, fui assaltada pelo barulho ensurdecedor quando voltamos ao antro. Bruna costurava entre os transeuntes com tamanha habilidade que fiquei admirada de não batermos em ninguém.
-Teus amigos estão para lá! - parei-a, estávamos indo para o lado oposto.
-Eu sei! - gritou-me de volta - Você não gostou deles!
Deixei-me levar por ela mais uma vez. Paramos numa sala com paredes e bancos todos em preto e branco. As luzes ali se alternavam entre branca e vermelha. Todos ali dançavam tão alucinados quanto os da pista principal. Um casal se pegava com tal gosto em um dos bancos que pude sentir as ondas de calor que emanavam, virei o rosto constrangida. Bruna ainda segurava minha mão, olhei-a, ela me fitava com vivo interesse.
-Dance! - gritou-me ela, mas ainda segurava firme minha mão, limitando qualquer movimento meu.
-Não gosto dessa música!
-Dance, por favor! Quero vê-la dançar!
-Não sei dançar essa coisa!
Pegou meu rosto entre as suas mãos e me gritou no ouvido: "é que você tem que sentir o ritmo primeiro!".
Suas mãos desceram pelo meu pescoço, pararam nos ombros. Olhava-me como nunca havia me olhado. Parecia que era a primeira vez que me enxergara. Ou a primeira vez em que me deixou vê-la me enxergar.  Virou-me de costas, deslizou as mãos por cima de minha blusa delineando meu formato, agarrou minha cintura e grudou-me nela.
-Está me sentindo?! - gritou-me no ouvido, pela primeira vez senti o calor de sua voz.
Fiz que sim com a cabeça, não foi necessário gritar. Ela sabia.
Suas mãos, em minha barriga, desceram até as cavidades ósseas da bacia. Fixaram-se ali com ímpeto. Dois dedos de Bruna embaixo do cós de meu jeans, à pouquíssimos centímetros de me fazer arfar. Estava completamente à deriva dela.
-Feche os olhos!
Obedeci. Bruna me guiava no mesmo ritmo de seus quadris. Um embalo tão acalentador que a música me tornou indiferente. Meu corpo todo seguia os movimentos do de Bruna. Uma de suas mãos deixou meu quadril e subiu por debaixo de minha blusa, senti seu dedo entre meus seios, no fecho do sutiã. Ofeguei. Sua mão desceu novamente com os dedos em direção a parte mais quente de meu corpo. Voltou à ponta pélvica de meu quadril, foi afrouxando aos poucos. As duas mãos subiram pelos contornos de meu abdômen, passaram pelos seios (apertando-os levemente) até as axilas, fez-me levantar os braços. E não era mais Bruna que me balançava.
-Agora dance! - gritou-me e se soltou de mim.
Eu dançava. Dançava sem nem saber se aquilo que fazia era dança. Pulava e gingava os quadris com os braços levantados, o nó que prendia meus cabelos se desfez com o balançar da cabeça, minha barriga aparecia ocasionalmente pelos movimentos alucinados que eu fazia e que levantavam minha blusa.
Fiquei daquela maneira por um tempo que sou incapaz de dizer. Poderia ter sido por segundos ou por horas.
Subitamente alguém se encaixou em mim pelas costas mais uma vez. Não era Bruna, sentia nitidamente um membro rijo a me comprimir, suas mãos eram mais pesadas em minha cintura e o cheiro que exalava era amadeirado, não o cítrico doce de minha amiga. Abri os olhos inundada por uma decepção inesperada. Um tapa na cara daquela realidade suja que me tirou de meu doce transe como um solavanco.
Onde estava ela? Desvencilhei-me levemente enojada do rapaz que agora lambia meu pescoço. Quando me esquivei por completo de sua presença ele me gritou algo que não entendi, mas que me soou claramente como uma ofensa.
Onde estava Bruna?
Bruna sempre me fora uma das poucas companhias femininas aturáveis de meu círculo social, tanto que na maioria das vezes em que me ligava, eu ia para onde ela escolhia sem nem pestanejar. Ela suportava meu mal-humor intransigente, minha capacidade de desistir das companhias extras, meu pessimismo com relação à felicidade alheia. Bruna aceitava o meu pior, sem nem ter garantias do melhor.
Bruna, onde se meteu?
O ar tornara-se denso, fazia força para enfiá-los nos pulmões. A música acelerada opunha-se à uma visão em câmera lenta de tudo e de todos. Sentia meu corpo extremamente quente em contraste com as extremidades como mãos e pés gelando. As luzes se misturaram com o som e de repente eram a mesma coisa: um peso colorido e gritante que me esmagava por todos os lados.
Bruna...?
Senti um braço fino suportar parte de meu peso envolto em minha cintura. Cítrico doce. Bruna.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

"Covardia"

Caminhei até as portas de vidro aproximando-me da imagem da bela lady de vestido preto e óculos escuros que desfilava ao meu encontro. Parei, apertei o botão 'subir' e sondei meu reflexo por baixo das lentes de novo. De fato todos aqueles olhares indiscretos (e secretos) na rua tinham fundamento. Sorri satisfeita com um dos cantos dos lábios e logo minha visão periférica encontrou outro objeto de ânimo. Caminhava a passos largos, também em direção ao elevador, um belo naipe. Alto, ombros largos, robusto, roupas em tons escuros e sóbrios... bem meu tipo favorito.
Um brinde às lentes escuras! Pude investigá-lo tranquilamente. O homem estacou ao meu lado, pressionou o botão, que já estava aceso e comprimido (revirei os olhos), e olhou-me (eu o observava pelo reflexo. Tinha barba por fazer. Ah, barbas por fazer!) e pelo seu semblante gostou do que viu. Tive que controlar minhas bochechas que queriam demonstrar o lisonjeio. 
O elevador chegou e ele, após cortesmente segurar a porta para eu entrar primeiro (belas mãos, sem aliança), verificou, sem disfarçar muito, se seriam só nós dois no elevador. Desta vez não consegui refrear o semi sorriso.  
Fecharam-se as portas. Acionei meu andar, sétimo. Ele, sexto.
'Vamos lá, tente alguma coisa. Qualquer coisa. Tente que vais conseguir'
No sétimo andar havia um café com vista panorâmica. Ótimo. Podíamos ficar ali a princípio. Havia uma mesa que ficava num lugar mais reservado do café que seria ideal para que suas belas mãos passeassem pelas minhas coxas sem que ninguém percebesse.
Ele me olhou, tirei os óculos para que minha intenção ficasse claramente estampada.
'Vamos, querido, não se acanhe! Não vais levar nenhum fora, muito pelo contrário!'
Havia códigos para esse tipo de situação, não havia? Se ao menos eu tivesse realmente prestado atenção naquelas revistas femininas que minhas amigas me liam. Tinha algo com "olhar e sorrir", não tinha? Nunca precisei desses truques. Sempre foi tão natural! Por que ele não tentava nada? Sorri.
O homem sorriu-me de volta um tanto admirado. Abriu a boca e a fechou desencorajado.
'Qualquer bobagem que dizer vai funcionar, vamos! Não tenho uma aparência tão inibidora, vá!'
Ele sentiria gosto de tutti frutti em minha língua e um aroma doce de Paris em meu pescoço...
Sexto andar. As portas se abriram.
O belo naipe me olhou e- como eu detesto analfabetos de olhar!- eu lhe sorri mais uma vez arqueando uma das sobrancelhas num claro convite à tentativa. Ficou me olhando num sorriso de surpresa e expectativa.
-Oi.
-Oi - estiquei mais os lábios num belo sorriso.
As portas se fecharam.
'E...? Só vai me dizer "oi"?!'
O SIM já pululava na ponta de minha língua enquanto ele tentava formular a pergunta.
Sétimo andar. Abriram-se as portas novamente. Continuou me olhando inebriado sem nenhuma iniciativa. Finou-se minha paciência. Assim como se desliga um plug, desliguei meu sorriso num piscar de olhos.
-Covarde.
Coloquei os óculos e sai para mais um café solitário.






segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Perfume

-Está com perfume?
-Não, por quê?
Aproximou-se de mim novamente, como se fosse me cumprimentar com um beijo no rosto mais uma vez. Mas dessa vez senti teu hálito morno e a ponta gelada de seu nariz em meu pescoço aspirando meu aroma. Pegou-me de surpresa, tanto seu ato inesperado quanto a reação de meu corpo (que me fez ter que disfarçar o arquejo): sorte a dele de estarmos em público.
-Então é cheiro de Natalie.

sábado, 28 de julho de 2012

Amor ao ódio

Suas pupilas de repente concentravam fogo. Não se sentia mais uma mulher, sentia-se um animal. Tinha sede de sangue! Queria machucá-lo sem nenhum motivo racional. Havia motivos racionais. Mas ela não sabia, não queria justificar aquele desejo com a racionalidade.
Levantou-se. Suas lentes homicidas focaram na gaveta da cômoda. No canto dos lábios guardava um sorriso doce do pré prazer do que estava para realizar. Retirou a arma branca da gaveta com as mãozinhas geladas e seu sorriso se abriu até esticar os lábios ao máximo, enquanto os longos cílios encostavam nas sobrancelhas com o arregalar daqueles olhões felizes e vorazes. Ela quase não se continha. A adrenalina deixara seu corpo elétrico, queria agir logo.
Súbito a expressão de euforia substitui-se pela de mais pura concentração (sem nunca deixar o brilho de entusiasmo dos olhos): ela deveria ir sorrateiramente surpreender sua caça. Saiu do quarto. O corredor era bastante estreito, pequeno, obscuro. Se alguém pudesse vê-la naquele instante enxergaria escassamente apenas o branco de sua regata e o reluzir de seus olhos inumanos. Viu a luz amarela se projetar pelas frestas da porta do banheiro. Os sons rasos que ele emitia eram combustível para a ira que a impelia. Sentiu-se forte, muito forte. Apertava com tanta força os dentes que se houvesse carne entre eles seria mutilada. Enquanto deu os poucos passos, surdos como de felinos, que faltavam para se por de frente a porta que o guardava, o cano da arma roçou lascivamente em sua coxa nua.
Com um único chute a velha porta de tranca enferrujada se escancarou e bateu estrondosamente na parede azulejada do banheiro antigo, branco encardido. Fora mais fácil do que imaginara.
Dois segundos. Foi o tempo infinito em que se olharam.
Ele teve a certeza, antes de sentir a dor excruciante que marcaria o início de seu fim, de que ela era a criatura mais linda e assustadora que já tinha visto em toda a sua vida. Um demônio vestido de anjo, ou vice-versa.
Ela estava ébria de um ódio lindo! Tão puro e genuíno que ela sentia como amor.
O som do único tiro que disparou naquela manhã mórbida ecoou nos pátios de estacionamento da vizinhança insensível, fazendo pássaros alçarem voo. Ela não queria que a bala o matasse.
Ele pendeu de dor com um grito grave quando o projétil cravou em sua rótula (ela não ouvia, estava surda de êxtase) e caiu batendo com a cabeça na janela de vidro depois que a bela perniciosa ainda lhe esbofeteou o maxilar com o revólver. Estilhaços de vidro e chuviscos de sangue enfeitaram os ladrilhos do piso. Pegou-o pelos cabelos e o arrastou até a banheira batendo-lhe brutalmente a fronte na borda. Mais carmim para a embriagar o olfato. Jogou-o de costas ao chão, respirava grotescamente expirando a cada segundo, e o montou licenciosamente. Surrava-lhe a cabeça com a arma com um vigor surreal. Era perfeito aquele momento! Nunca fora tão feliz, tão plena! Nada e tudo fazia sentido! Pela primeira vez ela sentia o amor jorrar-lhe da alma.

sábado, 14 de julho de 2012

Aflição

E lá estava a bela moça sentada naquele estofado que não era de couro, naquele carro popular sujo (certamente sem revisões que atestariam seu mau funcionamento), com aquela música horrível, decadente, de baixo nível. As placas de neon iluminadas à beira da estrada sinalizavam o destino barato ao qual ela se encaminhava. Ela podia sentir com extrema nitidez aquela vida (suja, de subúrbio, obscena) como um ser orgânico a lhe perscrutar, a lhe farejar com o focinho molhado de esgoto. E esse ser orgânico a queria. Queria aderir à sua massa fétida sua carne limpa, fresca, de primeira. O que eu estou fazendo aqui?! Perguntou-se tomada por um desespero mudo. Parecia que nunca iria conseguir voltar de onde nunca deveria ter saído. Sua garganta começou a arder em brasa. Os olhos armazenavam inícios de lágrimas rente aos longos cílios inferiores. Nenhum daqueles estranhos (inclusive a semiestranha que a conduzira até ali) podiam enxergar no escuro do automóvel os pontinhos brilhantes e salgados que já quase escorriam pela sua face de boneca.